Excesso de chuvas na região Sul e a ausência no Centro-Oeste são fenômenos que estão afetando a produção de alimentos no País neste ano.
As intempéries climáticas refletem em menor produção no início da cadeia produtiva, redução na oferta de alimentos e consequentemente devem impactar o preço dos alimentos ao consumidor final.
Com eventos climáticos contrastantes, Mato Grosso do Sul vivencia evento climático inverso ao do Rio Grande do Sul e pela primeira vez na história registra “seca” no Pantanal.
O nível de 1,44 metro na régua de Ladário para o Rio Paraguai fez com que a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) aprovasse nesta semana a Declaração de Situação Crítica de Escassez Quantitativa dos Recursos Hídricos na Região Hidrográfica do Paraguai.
O doutor em Economia, Michel Constantino lembra que as variações climáticas sempre afetaram a atividade produtiva.
“Quando acontecem mudanças extremas como a chuva do Rio Grande do Sul, os efeitos são de curto e médio prazo, elevando de forma imediata alguns preços por pela realização de estoques sem necessidade, por oportunismo, e em médio prazo pela menor oferta, que necessita ser atendida com importação e incentivos a produção”, comenta.
Conforme já publicado na edição de ontem (16) do Correio do Estado, a falta de chuvas já aponta para uma estimativa de quebra de 20,1% na produção agrícola de Mato Grosso do Sul.
A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) projeta 22,416 milhões de toneladas produzidas na safra 2023/2024, ante as 28,050 milhões de toneladas produzidas no ciclo anterior.
Além da redução da produção local, há ainda o impacto na produção dos outros alimentos, como o arroz produzido na região sul, pragas na citricultura que derrubou a produção de laranja, limão e outras frutas cítricas na região Sudeste, entre outros alimentos que tiveram a oferta reduzida no Brasil.
O doutor em Economia, Lucas Mikael, explica que para os consumidores, os efeitos dessa redução na produção podem ser significativos.
“Espera-se um aumento nos preços dos alimentos, já que a oferta diminuída pode elevar a demanda e a escassez relativa. Isso pode resultar em um impacto direto no bolso dos consumidores, especialmente para produtos derivados de soja e milho, que são amplamente utilizados na indústria alimentícia e na produção de ração animal”, detalha.
De acordo com o economista do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho (SRCG), Staney Barbosa Melo, a pressão sobre os preços já começa no campo.
“As intempéries climáticas são variáveis que impactam negativamente nos resultados de uma safra, reduzindo a produtividade das lavouras e das criações, podendo, em casos mais severos, dizimar toda a produção agrícola de uma região, reduzindo a oferta e afetando diretamente os preços desses alimentos”.
O economista Eduardo Matos ainda reforça que situação prejudica a produtividade, a estrutura de custos, a produção de modo geral, refletindo sobre a cadeia de preços.
“A produção agrícola de milho e soja principalmente, que por um lado compõe os alimentos que estão presentes no Brasil e por outro também serve como insumo para a produção de outros alimentos, como é o caso do ovo, do leite, a carne, seja ela de porco, frango ou bovina”.
A perspectiva de nova alta nos alimentos pressiona ainda mais o bolso do consumidor, considerando que os alimentos básicos já estão sob pressão inflacionária nos últimos 12 meses.
De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do País, os grupos com forte alta são o de tubérculos, raízes e legumes, com aumento de 27,81%; assim como o de leguminosas e oleaginosas, com variação de 17,57%, em igual intervalo; as hortaliças e verduras que subiram 14,26%; e as frutas, que tiveram elevação de 12,03%.
Entre os produtos, a cebola é a primeira no ranking de alimentos que dispararam no último ano, e registra elevação de 92,84% no período de 12 meses, até o mês de abril, em Mato Grosso do Sul.
Na sequência está a laranja pera com 67,07%, o azeite de oliva (44,90%) e a banana que aumentou 41,25%.
O arroz, um dos principais cereais consumidos pelos brasileiros, acumula alta de 27,10% em 12 meses. A batata-inglesa subiu 20,20% no intervalo de um ano e o tomate apresenta aumento de 17,30% no mesmo período.
Estudo publicado pela revista Communications Earth & Environment, de um grupo de economistas do Banco Central Europeu e da Universidade de Potsdam (Alemanha) baseado na análise de índices de preços aos consumidores e 121 países entre 1991 e 2020 destaca a flutuação do custo de alimentos ao longo de 29 anos como resposta a eventos climáticos que afetam a produtividade agropecuária, especialmente secas e temperaturas extremas.
A análise mostra que os efeitos do clima podem fazer com que a inflação dos preços dos alimentos aumente entre 0,9 e 3,2 pontos porcentuais por ano até 2035.
A partir dos dados foram traçadas expectativas de temperatura global e impactos climáticos projetados pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) para o período entre 2030 e 2060 que destacam o panorama de inflação.
Para o Brasil, a pesquisa aponta uma projeção de pressão inflacionária dos alimentos de 1,9% ao ano, daqui a uma década. Segundo o estudo, os países mais afetados são os que possuem faixas de territórios maiores em baixas latitudes.
Nesse sentido o O IPCC já projeta que a crise do clima terá efeitos desproporcional sobre países em desenvolvimento com consequências monetárias.
A partir do modelo matemático, os cientistas reforçam a precisão sobre os efeitos da queda de oferta de alimentos causados por altas temperaturas.
Já o impacto de chuvas nos preços depende de fatores como variação de precipitação, sendo necessário monitorar os preços por cidades, não apenas países, para entender os efeitos sobre a economia.
Ainda conforme a pesquisa, enquanto os países tropicais, como é o caso do Brasil, deverão experimentar essa pressão inflacionária ao longo de todo ano, países temperados em altas latitudes vão encará-la sobretudo no verão.
Na avaliação dos pesquisadores com a questão climática pesando de forma mais acentuada na inflação, torna-se mais difícil para os governos calibrarem suas políticas econômicas.
“Os nossos resultados sugerem que as mudanças climáticas poderão alterar aspectos da inflação como a sazonalidade, a volatilidade e a heterogeneidade, e gerar pressão persistente sobre os índices de inflação”, aponta o estudo.
Em conclusão, a pesquisa afirma que sem uma mitigação considerável das emissões de gases de efeito de estufa, as pressões sobre a inflação devem continuar persistentes e em nível considerável.
Com informações do Correio do Estado
Comments